Psicopatas Corporativos – Conheça os feitores modernos

Divulgue e opinie
Leitura: 4 min.

Como feitores modernos, os psicopatas podem encontrar um eco nas necessidades corporativas dos dias atuais. Essas pessoas também são conhecidas pela sua psicopatia funcional.

Ontem, eu dei de encontro com uma postagem no Facebook que tratava da exploração e dos maus tratos de pessoas em cozinhas profissionais. Sobre essa atividade eu fiz a seguinte observação:

Faz tempo que eu venho observando uma “cultura” de abuso nessa área profissional. Podemos ver isso nos programas de TV nos quais os participantes são humilhados, maltratados e quase ninguém acha isso estranho.

Com o passar do tempo, esses comportamentos abusivos são considerados normais e pessoas com perfil de abusadores acabam procurando esses ambientes para realizar os seus inconfessáveis desejos ….

Confesso que gosto de ver as pessoas elaborando as refeições, mas deixei de assistir por não concordar com essa cultura de abuso e não querer colaborar para isso.
Além disso, também deixei de ver pois esses comportamentos afetam negativamente o meu humor, mas tem gente que acha engraçado ver alguém gritando e dizendo que o participante vai “sentar na graxa” ou que é incompetente…..
Ninguém merece essas coisas.


No caso desse contexto da “arte da culinária”, o comportamento abusivo de algumas estrelas nos meios de comunicação de massa promove uma dessensibilização às práticas que todos nós deveríamos condenar. No campo corporativo o padrão comportamental segue essa mesma lógica.

A produtividade, o culto à personalidade e aos ganhos estabelecem o contexto para que práticas abusivas se instalem e prosperam. São histórias que comumente vemos nas barras dos nossos tribunais trabalhistas. É a psicopatia funcional que habilita certas pessoas a manipulares os outros nessas direções.

É aquela hora extra trabalhada e não paga, é pagar pelo serviço relativo ao desempenho de uma função, mas exigir que o profissional desempenhe várias. Isso ocorre no campo do magistério quando uma organização remunera os seus professores por hora-aula, mas são obrigados a orientarem os trabalhos de fim de curso como atividade “voluntária” ou supervisionar estágios, etc.

Quem, em sã consciência, teria estômago para alimentar e manter esse sistema? Entretanto, encontramos diversas pessoas bastante qualificadas para tal. É nesse contexto que pessoas com algum grau de psicopatia vão ao encontro dos mais sombrios e gananciosos propósitos corporativos. São pessoas aptas a assumirem o papel de feitores.

Lembremos as características da psicopatia sobre as quais tratamos em: 3 estratégias para aperfeiçoar o diagnóstico da psicopatia

 

Como se parece um psicopata?

A lista de características da psicopatia é a seguinte:

Como se apresentam para os outros?

    • Demonstram excesso de autoconfiança e “charme” superficial. (Os psicopatas exageram na confiança);
    • Apresentam fala grandiosa acerca de si mesmo. (Psicopatas se enxergam enormes, são exibicionistas verbais);
    • Contam mentiras frequentemente. (Os psicopatas não se importam com a verdade.).

 

psicopatia-funcional-psicopatas-corporativos-ibrale-450Comportamento afetivo dos psicopatas

    • Demonstram irresponsabilidade e “minimiza o dano” quando aparece um problema. (Os psicopatas não gostam de fazer a coisa certa. Tomam os atalhos e quando algo de ruim ocorre, eles minimizam o problema);
    • Percebe-se falta de remorso ou culpa no seu comportamento. (Os psicopatas não se sentem mal quando fazem coisas ruins.)
    • Sentem necessidade excessiva de realizar atividades intensas ou possui tendência ao tédio, caso as atividades não ocorram. (Os psicopatas não suportam períodos de marasmo.)

 

Comportamento social

    • São excessivamente impulsivos. (Os psicopatas são muito, muito impulsivos.);
    • Enganam ou manipulam os outros com frequência. (Os psicopatas normalmente acreditam que podem manipular qualquer pessoa ao seu redor);
    • Mostram dificuldade em tornarem-se emocionalmente íntimos. (Os psicopatas têm problemas para demonstrar emoções genuínas, o que acaba sendo evidenciado em relacionamentos mais longos e íntimos);
    • São pegos em situações nas quais mostram insensibilidade ou falta de empatia. (Os psicopatas simplesmente não se importam com as emoções das outras pessoas.);
    • Percebe-se que pode “parasitar” outras pessoas com relativa facilidade. (Os psicopatas preferem não trabalhar para viver. Eles acham que é mais fácil tirar coisas de outras pessoas ou viver às custas delas.);
    • Possuem histórico de comportamento sexual promíscuo. (Psicopatas gostam de “circular” entre as pessoas);
    • Demonstram dificuldade de manter relacionamentos de longo prazo. (Os psicopatas têm dificuldades em se comprometerem no longo prazo, e quando o fazem, o relacionamento é abusivo)
    • Possuem a tendência de ter metas apenas no curto prazo. (Os psicopatas preferem esquemas malucos [do tipo Ponzi, por exemplo] em vez de objetivos de vida ou carreira.);
    • Demonstram dificuldade em assumir a responsabilidade por suas próprias ações. (Para um psicopata, a culpa é sempre de outra pessoa)

 

Comportamento antissocial

    • Possuem histórico de problemas comportamentais precoces em relação à crueldade. (Quando crianças, os psicopatas costumam ter uma história de crueldade com os outros, começando com os animais);
    • Possuem dificuldade em controlar comportamentos socialmente inadequados. (Os psicopatas têm dificuldade em cumprir as normas sociais);
    • Apresentam tendência a “adaptar” as regras a seu favor, de forma bem versátil. (Os psicopatas diferem dos criminosos normais porque eles realmente não se importam com o tipo de lei que violam – eles violam qualquer uma delas, nas circunstâncias que mais lhes favoreçam)

 

Os feitores modernos | A psicopatia funcional

ibrale-feitores-modernosEntão, fazendo uma rápida análise nas características dos psicopatas, os feitores modernos, acima listadas, podemos entender que as pessoas insensíveis e manipuladoras, se encaixam muito bem nos perfis necessários ao cumprimento de normas e práticas perversas e exploratórias no ambiente do trabalho.

De forma nenhuma estou acusando as corporações de serem assim ou empregarem genericamente essas pessoas. Apesar de não esperar que a adoção dessas práticas sejam confessadas por quem as admite, é justo reconhecer uma grande quantidade de organizações que se preocupam com a saúde física e mental de seus colaboradores e também com o fiel cumprimento da legislação trabalhista.

Entretanto, é necessário afirmar que estarmos alertas à possibilidade da existência de feitores modernos nos ajuda a identificarmos situações e/ou práticas abusivas. Diante dessa consciência, os indivíduos afetados podem refletir na sua situação específica e tomar alguma decisão.

Lembro de minha própria trajetória profissional e acadêmica de mais de 40 anos. O processo do abuso no trabalho não é explícito. Não me chega à memória que alguém o tenha confessado.

Todas as milhares de horas trabalhadas sem qualquer remuneração adicional eram explicadas pela necessidade institucional e pelo “bem maior” que aquele sacrifício individual poderia significar.

Essa conversa sempre funcionou e segue dando certo como estratégia para as pessoas que recebem a tarefa de fazer os demais realizarem bem mais trabalho do que inicialmente se comprometeram.

Sem alongar a nossa argumentação, finalizamos pontuando haver um perfil de pessoa que não experimenta o sofrimento que nós sentimos ao participarmos de práticas exploratórias. Essas pessoas, os feitores modernos, são chamadas na literatura científica de psicopatas funcionais há algum tempo e você deve ter todo o cuidado com elas em sua vida.

Escrevi um artigo sobre a psicopatia funcional mais detalhado sobre isso, mostrando como essas pessoas são, também, aptas para serem antiéticas:

Pires, S.F.S. (2022). Aptos para serem antiéticos: a psicopatia funcional nas organizações. Revista Contemporânea, 2(4), 106–121.

Receba nossa Newsletter

Toda terça-feira, um tópico sobre educação socioemocional, linguagem corporal e emoções.

2 comentários em “Psicopatas Corporativos – Conheça os feitores modernos”

  1. Sempre uma ótima provocação! Você toca exatamente no ponto, é preciso ter atenção redobrada ao identificarmos um “psicopata funcional” nas nossas relações cotidianas para que não sejamos o veículo da realização dele e da nossa própria frustração e doenças. Sobre a questão do preparo das refeições, também acho muito agressiva a maneira e o vocabulário utilizado por grandes profissionais com quem está se empenhando pelo seu melhor e, não raro, já são muito bons para estarem ali, precisariam ser tratados com o respeito devido entre humanos, além do que esta “gracinha” de vocabulário ofensivo quando se trata de um ambiente onde se elabora algo que pessoas vão digerir , não sei , não…eu acredito na energia do alimento!! Obrigada, Sérgio por dividir suas reflexões baseadas em seus profundos estudos.

    Responder
    • Obrigado pelo seu comentário Teresa. A opinião dos nossos leitores sempre colabora para a construção de um conhecimento mais rico e profundo para todos nós.

      Eu mesmo pude experimentar diversos encontros com esses tipos de pessoas em minha vida profissional [lá vão 40 anos de trabalho]. Algumas dessas vezes, foram meus chefes. Acho que sempre tive uma certa sensibilidade para lidar com esses perfis, mesmo quando não sabia o conheço hoje.

      Sofri algumas vezes, mas no geral consegui escapar do pior. O meu conselho a todos é que, como eles têm esse “defeito” na regulação emocional, não há como ganhar deles….. Se jogarmos, vamos perder… simplesmente porque não estaremos dispostos:

      (1) a utilizarmos das mesmas estratégias sujas;
      (2) não conseguiremos manipular as pessoas para conseguirmos os nossos objetivos;
      (3) não seremos orientados por crenças e valores egoístas e narcisistas;
      (4) nem conseguiremos dormir tranquilos à noite, se tentarmos realizar algumas dessas coisas acima mencionadas.

      Então resta-nos apenas admitirmos que não somos páreo para eles… E se formos jogar de acordo com essas regras, o fracasso é inevitável.

      Entretanto, se a coletividade prestasse mais atenção, poderia enxergar essas características e evitar que esse tipo de pessoa florescesse em nosso meio, pois o que é difícil para uma única pessoa ou vítima, é mais fácil de enfrentar por um coletivo.

      Um abraço e siga acompanhando nossas postagens.

      Responder

Opine sobre isso!