Medo na Pandemia | 10 estratégias para enfrentar

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O medo na pandemia de COVID foi, inicialmente, instilado nas pessoas por meio de uma combinação de cobertura sensacionalista da mídia e alertas de saúde pública mal elaborados, sem base científica suficientemente sólida e difundidos por pessoas despreparadas. As fake news também tiveram o seu papel na disseminação do medo. Sobre as fakenews e os seus efeitos preparamos um artigo completo: A psicologia das Fake News: a mentira é eficaz?

A cobertura da mídia destacou a gravidade da doença, incluindo a elevada quantidade de mortos e a rápida disseminação do vírus. As autoridades de saúde pública e outras organizações de saúde forneceram informações detalhadas sobre os riscos associados, bem como medidas preventivas recomendadas. Essas mensagens de cautela, em um cenário inicial de incerteza, criaram, em muitos, um sentimento de medo e ansiedade.

Alvo de polêmica, em casos de calamidade pública, sempre será a decisão sobre que tipo de informação será adequada e como ela deverá ser difundida. Nem sempre há a conjunção de profissionais que estejam aptos a, simultaneamente, informarem e o fazerem de forma adequada. Ademais, há sempre alguma autoridade que pode basear suas campanhas no conhecido “medo funcional” (Harper et al., 2021).

A ideia de “medo funcional” envolve a cocepção de que o medo que nos ajuda a permanecermos seguros, fornecendo-nos um aviso instintivo de perigos potenciais. É elemento essencial para que apresentemos respostas a ameaças percebidas e nos ajuda a reconhecer e evitar perigos. Entretanto, nem sempre as comunicações recebem a formatação adequada  para não ultrapassarem os limites ao iliciar esse tipo de medo.

A par de tudo isso, está a imaginação das pessoas. Território fértil para a propagação das hipóteses mais desastrosas, ela se tornou um dos elementos principais da potencialização do medo e de cenários imaginativos ansiogênicos.

Os 10 principais elementos que disseminaram o medo na pandemia

A partir do cenário de incertezas e de conflito de informações anteriormente mencionado, o medo foi se difundindo. Simples como o medo de sair de casa, ou de viajar, se desenvolveram até suas formas severas como a ansiedade e o medo de morrer. A seguir listamos os 10 principais motivos de medo mencionados pela população (Asmundson & Taylor, 2020; Ornell et al., 2020; Schimmenti, Billieux & Starcevic, 2020):

1. Medo de contrair o vírus;
2. Medo de infectar outras pessoas, principalmente familiares;
3. Medo da insegurança econômica, devido às condições macroeconômicas;
4. Medo de perder entes queridos;
5. Medo de perder o emprego;
6. Medo de um futuro incerto;
7. Medo de ficar sem suprimentos essenciais para sobrevivência;
8. Medo de uma pandemia prolongada;
9. Medo de não receber cuidados médicos adequados;
10. Medo de não conseguir acessar os serviços necessários.

O que é o medo?

O medo é uma emoção básica profundamente enraizada em nossa fisiologia, mas que se manifesta de forma complexa. Do ponto de vista científico e evolutivo, o medo é uma resposta a algo percebido como uma ameaça potencial. É a forma do nosso corpo nos preparar para reagir à ameaça e nos proteger. Em questão de segundos, dezenas de substâncias químicas preparam o nosso corpo para realizar um esforço extraordinário.

Quando sentimos medo, nosso corpo é inundado por hormônios que desencadeiam uma resposta projetada para nos manter seguros e nos ajudar a sobreviver. Aumenta nossa frequência cardíaca e pressão sanguínea, proporcionando melhor oxigenação para nossos músculos. Simultaneamente, são liberados outros hormônios que podem nos deixar mais alertas e conscientes sobre o que ocorre ao nosso redor.

Além das alterações fisiológicas, o medo também produz efeitos cognitivos. Podemos ficar mais focados na ameaça potencial, melhorando a nossa percepção e procurando o perigo. Também podemos ter pensamentos intrusivos e preocupações sobre a ameaça, o que pode prejudicar a tomada de decisão sobre o que fazer e, se prolongado, pode ser ansiogênico.

O medo pode ser considerado uma emoção básica útil quando nos ajuda a identificar e responder a um perigo potencial. No entanto, o medo também pode ser um problema se ocorrer com mais frequência do que o necessário ou se for muito intenso. O medo na pandedmia pode levar a ansiedade, ataques de pânico e outros problemas relacionados à saúde mental.

No Atlas das Emoções (2018), elaborado pelo Dr. Paul Ekman, a anxiedade faz parte na família do medo. A figura abaixo foi elaborada de forma a distribuir as palavras que utilizamos para expressar a experiência subjetiva do medo em seus graus de intensidade crescente. Nessa ilustração, a ansiedade foi inserida no terceiro nível, veja:

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Termos que descrevem sentimentos de medo em suas diversas intensidades. Paul EkmanAtlas das Emoções.

 

Quais são os desdobramentos do medo no comportamento?

O medo é uma emoção que está presente em todos os animais, incluindo os humanos. É a resposta do corpo ao perigo e pode ser benéfica ou prejudicial, como anteriormente explicado. Embora possa nos fornecer um aviso de perigo e a motivação para agir, também pode ser paralisante e debilitante.

Quando uma pessoa sente medo, o sistema nervoso simpático é ativado, liberando hormônios como adrenalina e cortisol. Esses hormônios preparam o corpo para agir, aumentando a frequência cardíaca, a frequência respiratória, a pressão sanguínea e desviando o fluxo sanguíneo de órgãos não essenciais para os músculos. Como resultado, a pessoa pode sentir tremores, sudorese, tontura, náusea e outras alterações fisiológicas.

As respostas ao medo também incluem alterações na atividade cerebral. A amígdala, que está envolvida no processamento emocional, aumenta sua atividade, resultando em uma maior sensação de alerta. O medo também pode potencializar o acesso à memória, ajudando a lembrar o evento e os sentimentos associados. Os sentimentos são as interpretações subjetivas da experiência emocional como um todo.

O medo também pode causar alterações psicológicas desencadenado quadros de ansiedade, irritação e insônia. Também pode afetar o apetite, levando a transtornos alimentares.

A pessoa também pode experimentar sentimentos de tristeza, culpa ou vergonha, bem como uma diminuição de sua autoconfiança. Isso pode dar início a quadros depressivos mais severos.

O medo é uma emoção experimentada por todos nós e que desempenha um papel significativo em nossas vidas. É importante entender que o medo pode ser superado por meio da utilização de estratégias de enfrentamento adequadas.

 

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Como enfrentar o medo na pandemia? – 10 estratégias

Elaborei uma lista a partir da literatura científica (e.g. Peker & Cengiz, 2022; Ursu & Măirean, 2022; Schimmenti, Billieux & Starcevic, 2020). As estratégias mais importantes são as seguintes:


1. Identifique a origem do seu medo na pandemia;

2. Enfrente seus medos, dividindo-o em partes menores. Tudo começa ao reconhecer a emoção. Não tente negá-los;

3. Desafie os pensamentos negativos: o medo na pandemia geralmente envolve pensamentos negativos e crenças distorcidas. Tente desafiar esses pensamentos e crenças perguntando a si mesmo se eles são baseados em fatos ou suposições.

4. Visualize-se superando seu medo;

5. Tire um tempo para você: Encontrar um tempo para você pode ajudar a reduzir o estresse e a ansiedade. Certifique-se de reservar um tempo todos os dias para fazer algo que você goste.

6. Exercite-se regularmente: O exercício é uma ótima maneira de reduzir o estresse e a ansiedade. A atividade física regular pode ajudar a reduzir os hormônios do estresse e aumentar os níveis de endorfina, fazendo você se sentir mais relaxado e melhorando seu humor.

7. Evite cafeína, álcool e outros estimulantes: A cafeína e o álcool podem piorar os sintomas de ansiedade. Tente limitar a ingestão dessas substâncias ou evitá-las completamente.

8. Pratique técnicas de relaxamento: Técnicas de relaxamento, como respiração profunda, ioga ou relaxamento muscular progressivo, podem ajudar a reduzir a tensão física, a ansiedade e o medo na pandemia.

9. Converse com alguém: Conversar com um amigo ou familiar de confiança pode ajudar a reduzir os sentimentos de medo.

10. Procure ajuda psicológica profissional: Se o medo está afetando muito sua vida diária e você está tendo dificuldade em administrá-la, não hesite em procurar ajuda profissional.


O primeiro passo para lidar com o medo é identificá-lo. O medo pode vir de várias formas, incluindo medo do fracasso, medo do desconhecido, medo da rejeição ou medo de cometer um erro e o medo na pandemia. Você o perceberá principalmente pelos indicadores fisiológicos, como aceleração do coração, suor frio, extremidades frias, palpitações e sensações desagradáveis ligadas aos processos adrenérgicos.

Adicionalmente você pode aumentar a consciência sobre sua movimentação e expressões faciais e conhecer os indicadores do medo. Sobre isso, veja os artigos:

Como ler sua própria linguagem corporal?

Medo e Surpresa: você sabe as diferenças?

Após identificar o medo, é importante entender por que você o está sentindo. É a produção do sentimento, que é a experiência subjetiva com a emoção. Faça perguntas do tipo: você tem medo de falhar porque não quer decepcionar alguém? Você tem medo do desconhecido porque não tem certeza do que está por vir? Entender por que você está sentindo medo pode ajudá-lo a lidar melhor com isso.

O próximo passo é desafiar seu medo. Pergunte a si mesmo se o seu medo é baseado em fato ou opinião. Pode ser útil anotar seu medo e depois desafiá-lo. Pergunte a si mesmo se é realista e se há algum passo que você pode tomar para reduzir o medo.

É importante também reconhecer que o medo é normal e que não há problema em senti-lo. Também é importante atuar nas medidas de mitigação dos sintomas fisiológicos, que não costumam ser agradáveis. Praticar exercícios físicos e relaxamento, evitando o consumo de substâncias estimulantes.

Finalmente, pode ser útil buscar o apoio de outras pessoas. Falar sobre o seu medo com um amigo ou familiar de confiança pode ajudá-lo a se sentir menos sozinho e a ter uma perspectiva diferente. Se o seu medo for grave ou estiver afetando o seu dia a dia, é importante procurar ajuda psicológica profissional.

Lidar com o medo pode ser difícil, mas é possível. Ao identificar, desafiar, aceitar e buscar apoio, você pode gerenciar melhor seu medo na pandemia e tomar medidas para viver uma vida mais feliz e saudável.

Conclusão

O medo é uma emoção que evoluiu ao longo do tempo para nos ajudar a sobreviver. Do ponto de vista científico, é uma resposta a algo percebido como uma ameaça que desencadeia uma série de mudanças físicas, cognitivas e emocionais para nos ajudar em nossa proteção. As multiplas faces do medo na pandemia nada mais são do que isso.

O medo na pandemia se difundiu e os seus contextos de eliciação aumentaram. Então, siga os passos mencionados e se o quadro persistir, procure um psicólogo.

Boa leitura

Sergio Senna

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Referências

Asmundson, G. J., & Taylor, S. (2020). Coronaphobia revisted: A state-of-the-art on pandemic-related fear, anxiety, and stress. Journal of anxiety disorders76, 102326.

Ekman, P. (2018). Atlas of Emotion.

Harper, C. A., Satchell, L. P., Fido, D., & Latzman, R. D. (2021). Functional fear predicts public health compliance in the COVID-19 pandemic. International journal of mental health and addiction19(5), 1875-1888.

Ornell, F., Schuch, J. B., Sordi, A. O., & Kessler, F. H. P. (2020). “Pandemic fear” and COVID-19: mental health burden and strategies. Brazilian Journal of Psychiatry42, 232-235.

Peker, A., & Cengiz, S. (2022). Covid-19 fear, happiness and stress in adults: the mediating role of psychological resilience and coping with stress. International Journal of Psychiatry in Clinical Practice26(2), 123-131.

Schimmenti, A., Billieux, J., & Starcevic, V. (2020). The four horsemen of fear: An integrated model of understanding fear experiences during the COVID-19 pandemic. Clinical Neuropsychiatry17(2), 41.

Ursu, A., & Măirean, C. (2022). Cognitive Emotion Regulation Strategies as Mediators between Resilience and Stress during COVID-19 Pandemic. International Journal of Environmental Research and Public Health19(19), 12631.

 

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