FACS Certified Coder – O que é isso?

FACS Certified Coder é uma expressão genérica sobre alguém que realizou o teste sobre o Facial Action Coding System, que pode ser encontrado no endereço eletrônico do Ekman Group.

Consiste na suposta nomenclatura [explicarei mais adiante] de uma certificação que se obtém a partir da realização de um teste, com 34 questões em vídeo,  que permite ao examinado mostrar o seu conhecimento sobre o FACS.

Como percebi o aumento do uso dessa nomenclatura, conjugada com a de perito facial, para indicar uma certificação específica e supostamente muito qualificada, resolvi pesquisar e entender melhor sobre o tipo de habilitação associada que andam usando por aí, pois o teste do Ekman Group em si eu já conheço há muito tempo….

Nessa busca para esclarecimento pessoal, descobri que há fortes indícios de que tal expressão não é usada pelos falantes de Língua Inglesa. Para verificar essa hipótese, basta inserir “FACS Certified Coder” no Google e perceber que os resultados obtidos são de páginas originalmente escritas em Língua Portuguesa.

A pesquisa não retorna resultados exatos para Língua Inglesa, indicando, a princípio, que essa expressão não é utilizada nesse idioma.

Como é importante você saber o que está adquirindo quando se submete a essa certificação, leia com atenção o que será exposto a seguir.

O que realmente é essa certificação (FACS Certified Coder)?

Iniciemos a explicação pelo conteúdo exibido na página correspondente do Ekman Group:

O manual do FACs é propriedade intelectual do Dr. Ekman, sendo que a edição revisada é vendida em seu portal. Veja:

Custa US$ 350 [R$ 1.750 no dia dessa postagem]. Observe o que vem no “pacote”: (1) o manual revisado do FACS (527 páginas); (2) o Guia do Investigador (197 páginas); (3) um aplicativo para verificar os escores; (4) fotos e vídeos de exemplo. Esse é o material que ele comercializa para que a pessoa possa realizar o teste de FACS, que vem na sequência em sua página:

Esse teste, que custa US$ 50 [R$ 250], é composto de 34 questões em vídeo, que o examinado terá que responder para receber a certificação do Ekman Group. Observe que não há qualquer requisito para realizar o teste. Aliás tem sim, basta pagar os US$ 50.

Obviamente, não tem como alguém realizar o teste e ser bem sucedido sem saber o código [FACS]. Então, pra conseguir a aprovação tem duas saídas, ambas apresentadas nessa mesma página do Ekman Group:

Comprar o manual do FACS [R$ 1.750] e estudar sozinho;  ou

Aprender com alguém. No caso, ele recomenda uma determinada pessoa chamada Erika Rosenberg [colaborada antiga de Ekman], que ministra cursos para os que desejam se capacitar para o teste. [tenho a intenção de fazer uma entrevista com ela para saber mais]

Ainda nessa página, está escrito que a duração média de uma preparação individual [a partir do manual do FACS] para realizar o teste tem a duração de 50 a 100 horas. Então, o Ekman Group por si não realiza curso sobre o FACS.

Isso é compreensível, pois uma mesma organização não deve realizar um curso para um teste que também elabora, aplica e certifica das competências!

No site de Erika Rosemberg, no dia dessa postagem, constava o valor de US$ 975 [R$ 4.875] por nove sessões coletivas que ocorrem num período de 3 meses, com duração total de 19 horas. 

Pelas informações acima expostas, podemos concluir algumas coisas:

O Paul Ekman Group não realiza cursos para certificar sobre FACS

A estimativa de 50 a 100 horas de estudo consta na página do teste de FACS e se refere ao estudo individual a partir do manual por eles comercializado. Não significa que alguém tenha realizado um curso de 50 a 100 com o Dr. Ekman;

A Dra. Rosenberg é a indicação do Ekman Group para a preparação sobre o FACS e a duração total de seus encontros somam 19 horas. Essa é a preparação recomendada por eles, se for estudar com alguém, para a realização do teste.

Então, até aqui já conseguimos descobrir algumas informações:

(1) que a expressão FACS Certified Coder aparece em páginas escritas em Língua Portuguesa e você não encontra ocorrências exatas no idioma Inglês [interessante, não é?]

(2) Que a certificação em si é financeiramente acessível [R$ 250]. Uma pechincha, comparado com o valor das 19 horas dos cursos da Dra. Rosenberg [R$ 4.875] ou do preço do manual do FACS [R$ 1.750], que você vai ter que comprar se quiser estudar sozinho [curioso também, você não acha?].

(3) Não está explicitamente escrito, mas eu aposto que um dos materiais obrigatórios para realizar o curso da Dra. Rosenberg seja o manual do FACS, pois ela não ia se apropriar indevidamente dessa produção, nem gastar tempo elaborando um material derivado [pagando direitos mesmo assim], para usar nos seus cursos….

O que você pode efetivamente fazer com o FACS?

Entendo ser importante você ter clareza do que pode fazer quando se capacita como codificador de FACS.

O Facial Action Coding System (FACS – Sistema de Codificação da Ação Facial) é um sistema criado pelos Drs. Paul Ekman e Wallace V. Friesen e publicado inicialmente em 1978. Foi baseado no trabalho original de Carl-Herman Hjortsjö (1914-1978). 

Em 2002, sofreu uma revisão e hoje é considerado [erroneamente, em minha opinião] por muitos como um sistema interpretativo das emoções humanas. A codificação de FACs se tornou popular entre psicólogos e até mesmo se espalhou para o setor de entretenimento, onde foram usados ​​na produção de séries como Lie to Me e em desenhos animados.

Foi elaborado para servir como uma “linguagem” na qual os movimentos dos músculos faciais individuais [ e alguns poucos grupos] e movimentos da cabeça são representados por um código de números e letras.

Fazer um curso de FACS, como o Dra. Rosenberg [ou qualquer outra pessoa], não vai te habilitar a entender de emoções. A competência a ser construída está relacionada com a observação de certos movimentos faciais e a sua devida codificação em números e letras [FACS], assim como você vê aparecer nos episódios do seriado Lie to Me….   

Quando o Ekman Group vende, junto com o Manual do FACS, um “Guia do Investigador“, revela outro indício de que eles mesmos sabem que não adianta aprender o FACS para interpretar emoções…. Você precisa de uma forma de interpretar o movimento e associa-lo a certas emoções que ocorrem em um contexto interativo. Aí sim você terá os elementos mínimos para interpretar o que está ocorrendo.

Eu, por exemplo, prefiro ensinar aos meus alunos os nomes dos músculos. É simples, é fácil, o efeito pedagógico é o mesmo, os nomes da musculatura estão aí [alguns deles] há centenas de anos, tem farta literatura gratuita a respeito, você não precisa pagar direitos autorais a ninguém, nem infringir qualquer lei desse tema.

Vou dar um exemplo positivo para ninguém pensar que eu “tenho bronca” do FACS. Imagine que você está fazendo uma pesquisa sobre expressões faciais durante a conversação. Seria interessante fazer um levantamento estatístico da frequência dessas expressões. Nesse caso, o trabalho seria facilitado se elas fossem codificadas pelo FACS.

Mas tem o EMFACS [Emotion FACS], então o que você falou não se aplica….

Aplica sim, vamos lá destrinchar então.

No portal do Ekman Group tem a seguinte explicação sobre o EMFACS [já vou apresentar uma tradução livre, mas recomendo que você leia no original]:

“

EMFACS (Emotion FACS) é uma aplicação seletiva de pontuações do FACS, nas quais os codificadores pontuam apenas o comportamento que provavelmente terá significado emocional. Para fazer isso, o codificador examina o vídeo em busca de combinações básicas de eventos que sugerem certas emoções. (…) Portanto, o EMFACS é o FACS aplicado seletivamente. O EMFACS economiza tempo, pois não se codifica tudo. A desvantagem é que pode ser mais difícil obter um acordo entre os codificadores no EMFACS, pois os codificadores precisam concordar em duas coisas: 1) qual evento codificar e 2) qual código atribuir aos eventos selecionados. [grifos nossos]

Bem-vindos à vida real! Nosso grifo é para mostrar que o difícil não é codificar, e sim discriminar as emoções no meio de outros  eventos, selecionar o que interessa no dado contexto específico e interpreta-las, considerando tudo isso e mais outras informações disponíveis.

Está aí escrito com todas as letras pela própria equipe do Dr. Ekman, que já  não se envolve pessoalmente nessas questões, pois está bem idoso.

Por isso é mais fácil vender um processo de codificação do que um processo interpretativo geral. Sacou? Como diria um grande pensador….

Paul Ekman International – PEI

Se você já andou por aí no território digital, deve ter encontrado essa marca. Ali sim tem um programa de afiliados que promete certificação pelo Dr. Paul Ekman. A transparência das informações está bastante prejudicada, mas uma rápida investigação amadora nos dá conta que a pessoa por trás dessa outra empresa é Cliff Lansley e a base territorial do negócio é a Inglaterra.

Em um primeiro olhar, me parece uma “franquia” do que já foi produzido pelo Dr. Ekman. Como o nosso objetivo nessa postagem era explicar o que significa ser um “FACS Certified Coder” e também mostrar a origem desse nome, deixaremos a tarefa de entender melhor as relações entre o PEI e o Ekman Group para outra postagem.

Mas é possível dizer que, a partir de uma primeira busca interna no site PaulEkman.com, não encontramos nenhuma menção ao PEI [curioso,  não?]. Mais informações ficarão para outra postagem.

O que precisa para ser um especialista em linguagem corporal, análise da mentira ou FACS Certified Coder?

Você pode ver a orientação que damos sobre esses tópicos nas seguintes postagens:

Resumindo sobre a expressão “FACS Certified Coder”

Agora você já está melhor informado sobre as reais e principais possibilidades e limitações do FACS.

Já pode, também, avaliar melhor o que significa a expressão FACS Certified Coder, que normalmente estamos encontrando associada à expressão “perito facial“, e sabe que só a encontramos [a expressão exata] em sites de Língua Portuguesa e que esse dado é bem interessante para refletir sobre o seu uso persuasivo….. 

O EMFCS é só um núcleo de códigos FACS que se sabe estarem associados a determinadas emoções. Também não é um framework  interpretativo.

A última conclusão é que não dá para que alguém se considere um intérprete de emoções gastando US$ 50, nem acertando 34 questões em vídeos. Para conhecer e ser bom nisso, a pessoa precisa dedicar a sua vida [veja o depoimento da Dra. Rosenberg em seu site], inúmeros recursos que tenha, estudar muito, empregar bastante tempo [medidos em anos] e devotar paixão em compreender o comportamento humano.

Espero que você se sinta mais informado a respeito e motivado a desviar do caminho fácil. Essa trilha mais fácil pode dar condições para alguém cantar vantagem aqui e ali e usar uma expressão bacana que tem o seu apelo persuasivo, mas que não habilitará para realizar o trabalho profundo e interpretativo que precisa ser feito e que é requerido nessa área.

O meu desejo não é desanimar as pessoas que estão em busca de certificações, mas sim esclarecer o que algumas delas significam e quais são as habilitações decorrentes. Como muito bem expressou, uma pessoa muito estimada, Virginia Fantoni, em um comentário na rede LinkeDin:

“Não se trata de desvalorizar o produto, mas de deixar claro o que estamos comprando!”

Isso mostra como uma pessoa consegue sintetizar a intenção do que foi escrito aqui em apenas uma sentença!

Considerando o que expusemos aqui, seria correto que alguém que fez esse teste do Ekman Group se autodenominar Perito Facial? Afinal, o que é isso? Você sabe?