Klara Castanho: um caso de execução em praça pública e falta de empatia

Divulgue e opinie

Klara Castanho, ao ter sua intimidade violada nas redes e ao ser atacada por haters, resumiu a sua história – Fui Estuprada! Aqueles que estão acostumados a lerem os meus artigos, devem lembrar que eu já me refiro às redes sociais como uma versão moderna dos feak shows [sobre isso veja: Você identifica a mentira pelo movimento dos olhos?], nos quais pessoas com deficiência eram expostas como atrações, em circos. Isso ocorreu até meados do Século XX. Felizmente, as pessoas perceberam o absurdo que isso significava.

Não obstante, vale refletirmos sobre a existência de uma certa quantidade de pessoas que pagavam para assistir à exposição dessas pessoas com deficiência. O tema foi enfocado no filme O Homem Elefante [1980].

O que nos interessa, nesse caso, é compreender que haverá sempre uma certa quantidade de pessoas que estarão interessadas em utilizar os novos meios tecnológicos com velhos propósitos. A tecnologia avança, mas não necessariamente a nossa evolução emocional acompanha esse processo.

Assim como as redes são utilizadas com a finalidade de expor as bizarrices de nossas sociedades, também serve como uma praça pública para execuções ou pelourinhos modernos. Identifico processos dignos da brutal idade média, não sem motivos também conhecida como idade das trevas…..

Estaríamos nós vivendo uma versão digital da idade das trevas? A resposta parece, assustadoramente, ser afirmativa…..

Haters e a falta de empatia

Cada vez mais somos testemunhas de comportamentos de ódio nas redes. Basta ver uma notícia um pouco mais polêmica ou pessoal para lermos comentários negativos. Quanto mais conhecida a pessoa é do público, pior fica a situação para ela…. Mesmo diante da escassez de informações, diversas pessoas gastam o seu tempo para especular, levantar hipóteses absurdas e, não raras vezes, deixar comentários ofensivos utilizando o pior do vocábulo que o seu idioma pode oferecer [essas pessoas são conhecidas como haters]. A sensação psicológica de distanciamento e de anonimato oferecida pelas Redes parece facilitar a expressão do pior que o ser humano tem a oferecer….

Interessante é notar que a contraposição com mensagens positivas e de confronto aos haters não ocorrem com a mesma frequência. Pode ser que as pessoas de bem se omitam diante do risco de se tornarem igualmente vítimas dos haters…. Ou estejam demasiadamente ocupadas fazendo coisas produtivas que não sobre tempo para interagirem nas redes sociais.

De qualquer forma, é um fato que a chance de alguém ser ofendido nas redes por alguma polêmica é muito maior do que ser elogiado pelas suas boas ações. A impressão que fica é que alguém procura, intencionalmente, o que criticar, ainda que seja algum argumento inferido ou imaginário.

O fascínio pela fofoca – Klara Castanho

A fofoca é um fenômeno geral. Atinge todas as culturas desde longínquos tempos. As Redes ampliaram esse poder. É a ubiquidade da fofoca. Não consigo compreender a curiosidade das pessoas a respeito da vida privada alheia. Por um lado, parece ser uma demonstração de insegurança, querendo comparar a sua própria vida com a do seu semelhante. Por outro, uma demonstração indireta da perversidade humana, pois essa curiosidade se mostra mais intensa quando ocorre algum evento negativo na vida das pessoas observadas….

É uma curiosidade mórbida, já que não é a busca do conhecimento para tomar alguma providência ou, necessariamente, para ajudar em alguma medida. É, na maioria das vezes, mera curiosidade para estimular algum mecanismo psicológico deturpado de sentir-se melhor com a desgraça alheia…. No caso dos jornalistas [se é justo que podemos usar esse substantivo para os carniceiros da fofoca], entendo que se colocam na posição de “inside traders“. Querem mostrar que têm acesso exclusivo à intimidade de gente famosa, numa demonstração fática de que “quem detém a informação detém o poder” [Alvin Toffler]. É uma questão de narcisismo e mostra de poder. Fazem isso para conseguirem notoriedade nas redes sociais.

São mantidos pela curiosidade alheia. Pense nisso, se não houvesse quem se interessasse por essa categoria de matéria, esses abutres estariam sem emprego nessa área. Então, quando você perceber que é uma matéria de fofoca, não compartilhe e reaja negativamente nos comentários daquele texto.

Para conhecer mais sobre como a fofoca pode ser nefasta em sua vida veja nosso artigo: A fofoca e os seus poderes]. 

Uma das últimas vítimas disso foi a atriz Klara Castanho, o que veremos a seguir.

O caso Klara Castanho

Klara Castanho foi surpreendida com um linchamento digital. Internautas, ao descobrirem que ela havia dado à luz e que havia providenciado a adoção para essa criança, começaram a levantar hipóteses e a ofender a atriz. Tal foi a comoção dessa mulher, que resolveu narrar e expor a sua história, que essa criança havia sido fruto de um estupro e que não tinha condições de exercer a maternidade.

klara-castanho-hatersEla conta que, apesar de não certeza, entende que profissionais de saúde, do hospital em que realizou o parto, espalharam a notícia. Rapidamente, colunistas de celebridades [fofoqueiros] passaram a procurá-la para ouvir “o seu lado” da história. E, obviamente, saíram espalhando a notícia pelas Redes. Ela afirma que foi mais de um.

Lamentável ver que essa pessoa teve sua privacidade invadida sem nenhuma empatia. Objetivando apenas expor a notoriedade de uma história que, para o público, vai durar uma semana ou duas, no máximo. Mas que para as pessoas diretamente envolvidas, principalmente para a atriz e, futuramente, para a criança, perdurarão para toda vida…..

Essa categoria de fenômeno já ocorria antes, como foi o caso do ator Mario Gomes, em 1977, e que, até hoje, tem que contar e recontar o caso de sua suposta entrada num hospital do Rio de Janeiro para a retirada de uma cenoura que supostamente houvera sido enfiada em seu corpo. Décadas depois dessa mentira, ele ainda precisa dar explicações e reviver o evento que tanto prejudicou a sua carreira.

Em um caso de flagrante invasão de privacidade, Klara Castanho resume a sua dor:Fui estuprada“.

Depois do dano realizado, da matéria veiculada e, diante da reação negativa de alguns internautas, um dos “jornalistas” veio a público pedir desculpas e mostrar-se arrependido. Colhidos os fugazes louros de sua falta de ética – os likes e compartilhamentos nas Redes, realizados por pessoas tão doentes quanto ele, qualquer manifestação é apenas nominal. Esse tipo de arrependimento não adianta e não é improvável que seja apenas para limpar a sua barra diante da reação negativa dos seus leitores. Em minha compreensão, é o mesmo que atropelar uma pessoa depois de ingerir bebida alcoolica e pedir perdão pelo ocorrido.

Provavelmente, Klara Castanho será revitimizada muitas vezes em sua vida, pois existe outro tipo de jornalista que vai pedir para ela contar como foi ter a sua vida exposta, condenando e criticando a exposição. É uma forma dissimulada de realizar o mesmo ato de expor a pessoa. Os ganhos são os mesmos, a audiência.

A ambiguidade das redes sociais

Nesse ponto, devemos destacar a ambiguidade das redes sociais. Assim como a energia nuclear, as redes podem ser utilizadas para o bem ou para fazer o mal. Na verdade, a ambiguidade não é das redes, mas do ser humano.

Alguns preferem entender que o ser humano é naturalmente bom [Rousseau era um desses] e que a corrupção vem pelo social. Outros julgam que “pau que nasce torto morre torto“. O que essas duas concepções têm em comum é naturalizar o bem ou o mal. Todos nós temos o potencial simultâneo de sermos bons ou maus. São as nossas ações [comportamento intencional] que mostrarão qual dessas posições, naquele caso concreto, adotamos. Isso tem relação com as crenças, valores e emoções que utilizamos para guiar o nosso processo decisório.

Em relação ao caso da atriz Klara Castanho, senti uma indignação com o que fizeram com ela, suficiente para escrever esse artigo e expor as minhas ideias sobre o assunto. Vítima de intolerância, desrespeito e falta de empatia, seguirá sofrendo prejuízos ao longo da vida, assim como ocorreu com Mário Gomes.

Como já escrevi em detalhes, a empatia é um dos simuladores que temos em nosso psiquismo [sobre isso veja: Empatia e maturidade emocional]. Consiste em um processo psicológico complexo [não é somente uma emoção] que nos permite simular as condições de outras pessoas. É possível, então, sentirmos emoções semelhantes e simularmos o processo decisório e emocional das outras pessoas. Não tem relação necessária com a realidade, pois até mesmo diante de um filme, mostramos empatia ao nos emocionarmos com os atores, mesmo sabendo que não é real. É muito poderoso, a ponto de um roteirista competente fazer você se emocionar pelo bandido.

É tão básico, que até mesmo os demais mamíferos apresentam comportamentos empáticos. Fenômeno comum nas redes, entretanto, parece ser a empatia ao reverso. Ao identificar alguém que está precisando de apoio emocional, os haters invertem a solidariedade e oferecem ódio, desprezo e ofensas. A Bíblia sagrada afirma que a “boca fala do que está cheio do coração“. Isso nos indica que a explicação para esse fenômeno está no emocional dessas pessoas perversas.

Por isso, nessas situações de suposto anonimato, é sempre bom observarmos o que ocorre, pois é um indicador seguro das crenças, valores e emoções dessas pessoas tóxicas, ainda que o seu comportamento seja ambíguo.

Conclusão – Praça pública para pessoas sem empatia

Podemos concluir que os linchamentos em praça pública, a moderna versão da brutalidade medieval, seguirão ocorrendo. Pedimos a Deus para nos livrar dessas situações. Oferecemos, entretanto, nossa empatia a pessoas como Klara Castanho que, apesar da natural fragilidade emocional do momento delicado por que passa, soube reagir com classe e coragem. Expor a sua vida não é fácil, a sua intimidade menos ainda. Infelizmente, pela sua profissão, precisa manter suas redes sociais ativas.

Quando me perguntam o porquê de apenas postar material científico e meus artigos nas minhas redes, a resposta está aí. Privacidade. A minha vida pessoal não está nas Redes… Certa vez um hater postou uma acusação de que eu, secretamente, desejava ser um influenciador digital…. Não poderia estar mais enganado!

A inveja e o desprezo são emoções que só trazem o mal para quem as alimenta. Somos humanos, e nenhum de nós está livre delas….  Pensar que está imune a elas é o primeiro e derradeiro equívoco. Entretanto, um estudioso das emoções como eu não poderia deixar de ter um cuidado tão especial com essas tão danosas emoções. Ao primeiro sinal delas, acende um sinal enorme de alerta de que algo deve ser feiro.  Não há aspectos positivos que possam ser encontrados nessas emoções. Mais um exemplo de como essas pessoas instilam o pior que existe dentro delas, na esperança de que suas vítimas sucumbam aos seus apelos perversos.

O que, então, fazer com os haters? Por respeito aos meus leitores, eu respondia mensagens ofensivas. Movido pelas minhas convicções democráticas, eu mantinha mensagens ofensivas no meu Portal. Hoje em dia eu não permito mais esse abuso. Aconselho que você mantenha um botão imaginário de EJETAR em sua mente. Ao encontrar essas pessoas, não hexite em ejetá-las de sua vida! É a única saída. Não perca o seu tempo tentando mudá-las.

Fica a nossa reflexão sobre a nova versão digital da execução em praça pública. E você? Será que o que você vem mostrando nas redes sociais não pode dar margem aos haters? Já ocorreu um caso assim com você? Deixe um comentário.

Boa leitura

Sergio Senna

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