Ansiedade e aceleração social

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A ascensão das mídias sociais e a quase onipresença da tecnologia em nossas vidas facilitaram um fenômeno conhecido como aceleração social. Esse é um termo que se refere ao aumento da velocidade com que a informação e a comunicação ocorrem na atualidade e está relacionado à ansiedade.

♦ FATO

À medida que mais e mais pessoas dependem da tecnologia e da conexão às suas redes sociais, a quantidade de informações compartilhadas, em um curto período, continua a aumentar.

Infelizmente, a pesquisa científica mostra que esse aumento na velocidade de comunicação também é ansiogênico (e.g. Andrade & Calixto, 2020; Friedman & Janssen 2010; Singh & Shama, 2018).

A ansiedade é um transtorno de saúde mental caracterizado pela preocupação e pelo medo excessivos. Pessoas ansiosas, geralmente, têm dificuldade em lidar com suas emoções e podem ficar sobrecarregadas em situações sociais. Com o aumento no fluxo de informações e a necessidade psicológica de estar constantemente conectado, as pessoas com ansiedade inicia a sensação psicológica de sobrecarga.

As mídias sociais, por exemplo, podem estar no centro desse processo. O fluxo constante de novos conteúdos, de duração cada vez menor, não raras vezes relacionado ao entretenimento, pode ser difícil acompanhar. As últimas notícias ou tendências, a pressão por responder rapidamente ou correr o risco de ficar de fora da “última onda”.

São esses cenários imaginativos os que mais cooperam para o agravamento dos estados de ansiedade.

O aumento da aceleração social também tem sido associado a outros problemas de saúde mental, como depressão e solidão. Diante da capacidade de se conectar a pessoas de todo o mundo, a qualquer momento, pode ser difícil realizar a desconexão.

A mera tentativa de reduzir a interação virtual pode levar a ideações de isolamento, cenário que contribui, ainda mais, para a instalação de um quadro depressivo. Além disso, a pressão para acompanhar as últimas notícias e tendências pode levar a percepções de inadequação diante do insucesso em manter-se inteirado, o que é meis um elemento ansiogênico.

 

O que é aceleração social?

O termo “aceleração social” refere-se ao ritmo crescente das mudanças sociais e aos efeitos associados que ela tem sobre os indivíduos e as sociedades (Rosa, 2010). Isso levou a um aumento da ansiedade em muitas áreas da vida, pois a velocidade da mudança pode ultrapassar a capacidade individual em acompanhar.

Em particular, rápidas mudanças na tecnologia, comunicação e informação podem deixar os indivíduos se sentindo sobrecarregados e incertos sobre o futuro.

São dois os elementos principais para essa aceleração:

(1) a diferença entre a velocidade da informação digital e a velocidade dos processos naturais humanos;

(2) a ganância corporativa em apresentar cada vez mais anúncios em sua estratégia de monetização

Mais adiante, vamos explorar os efeitos da aceleração social na ansiedade e como ela pode ser gerenciada.

 

Quais são os 10 principais efeitos psicológicos da aceleração social?

A pesquisa científica atual (e.g. Brenner & Bhugra, 2020; Sugarman & Thrift, 2020; Berardi & Silva 2019; Buddeberg & Hornberg 2017) aponta para os seguintes efeitos psicológicos da aceleração social:

O aumento:

    1. dos níveis de estresse, ansiedade e depressão;
    2. da necessidade psicológica em se mostrar competitivo;
    3. de problemas relacionados à atenção;
    4. do senso de urgência;
    5. do risco de esgotamento [burnout];
    6. da percepção de isolamento;
    7. do medo de perda.

 

A diminuição

    1. da empatia;
    2. da capacidade em estabelecer conexões sociais não-virtuais;
    3. das habilidades em manter relacionamentos significativos.

 

aceleração social e ansiedadeComo podemos ver, pela rápida análise dos possíveis impactos psicológicos negativos da aceleração social, é um tema que deve merecer a nossa atenção.

Os estudos científicos ainda são insuficientes, mas estão avançando para prover uma inteligibilidade mais consistente sobre as influências da redução do ciclo de apresentação de conteúdo no comportamento humano.

 

Anúncios nas mídias sociais e ansiedade

Não é necessária uma análise muito profunda para chegarmos à conclusão de que a ganância é um dos valores que está na raiz da aceleração social. Um dos principais elementos da aceleração social relacionada às mídias sociais é a redução, cada vez mais severa, do ciclo de apresentação de anúncios.

A principal forma de monetização nas redes sociais é a comercialização desses espaços de publicidade. Então, para lucrar mais, é necessário apresentar mais.

Uma das grandes vitórias das empresas que mantém as redes sociais, foi convencer os anunciantes da pagarem por “exibição”. Então, nesse cenário, não é necessário haver uma interação com o anúncio para que o seu pagamento seja devido pelo anunciante.

Outro grande feito dessas mesmas empresas foi estimular a crença em que todo esse processo é honesto, já que a mesma empresa que vende os espaços, certifica que os anúncios foram visualizados e realiza a cobrança. É um processo nada transparente.

♦ ATENÇÃO

Então, ciclos mais curtos de apresentação de anúncios podem aumentar a velocidade da atividade social. Em geral, esses ciclos promovem o aumento da frequência de uma percepção de urgência para os usuários realizarem ações.

A relevância, para as redes, é estimular o que eles denominam de “um maior nível de engajamento” com o conteúdo. Esse maior envolvimento pode levar a um compartilhamento mais rápido e respostas mais rápidas ao conteúdo, resultando em uma taxa maior de aceleração social.

Um dos indicadores mais importantes desse perverso processo de manipulação nas redes sociais é o fato das empresas não divulgarem a quantidade de anúncios veiculados, muito menos algum indicador de sua eficácia.

♦ DICA

A percepção mais importante que devemos ter é que não temos como competir com sistemas cibernéticos digitais.

Eles sempre:

    • serão mais rápidos do que nós;
    • serão persistentes;
    • vão estar disponíveis em qualquer lugar que haja uma conexão;
    • estarão contigo em qualquer lugar [ubiquidade – celulares] e, brevemente, estão em seu corpo.

 

Além disso, a aceleração social pode bagunçar as suas emoções. Sobre isso veja:

Aceleração social e emoções

 

Ansiedade é um tipo de medo?

A relação entre medo e ansiedade pode ser complexa e difícil de entender. São duas emoções distintas, mas compartilham alguns pontos em comum e muitas vezes podem ser vivenciadas juntas.

Paul Ekman (2018) explica que o medo é uma emoção relacionada à percepção de uma ameaça específica, presente e conhecida; ansiedade é um estado emocional geral de nervosismo ou mal-estar sobre um futuro incerto.

O medo é uma emoção frequentemente desencadeada em resposta a um perigo ou ameaça específica que pode ser vista, ouvida ou sentida. Sua principal função é nos preparar para a ação e, geralmente, dura pouco e se dissipa quando a ameaça percebida desaparece.

A ansiedade, por outro lado, é um estado psicológico e fisiológico de mal-estar, angústia e pavor que muitas vezes resulta de incerteza. Pode ser causada por uma série de fatores, incluindo situações e eventos completamente imaginários e que ainda não ocorreram.

É, portanto, uma emoção mais difusa e menos específica do que o medo. Geralmente pode durar dias, semanas e até meses.

medo-e ansiedade
Termos que descrevem sentimentos de medo em suas diversas intensidades. Paul Ekman – Atlas das Emoções.

 

Palavras finais

No geral, a aceleração social pode ter um impacto profundo e bastante negativo em nossa saúde mental. É importante estarmos atentos aos potenciais riscos e tomarmos medidas para lidar com a ansiedade.

♦ DICA

As melhores estratégias para lidar com a ansiedade proveniente da interação com sistemas cibernéticos é a praticar a RENÚNCIA e a DESCONEXÃO PLANEJADA.

A renúncia é importante, pois mostra que conseguimos escolher, optar por quais estímulos estaremos expostos. Com o passar do tempo e com o treinamento dessa renúncia, ganhamos maior controle e autonomia sobre esses estímulos e sobre suas condições. Isso é conhecido na literatura científica como contracontrole.

Contracontrole é um conceito antigo, introduzido por Skinner (1953), e definido como um comportamento operante cuja função é tentar fugir ou esquivar de condições aversivas impostas por outro “indivíduo”, em nosso caso, os sistemas cibernéticos.

A desconexão planejada é a forma de priorizar a que tipo de estímulo estaremos expostos e por quanto tempo. É uma forma de exercermos o contracontrole.

Isso inclui o estabelecimento de limites em relação ao uso da tecnologia, tomar a decisão de não estar conectado 100% do tempo e procurar ajuda de um psicólogo, se necessário.

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Referências

Andrade, R., & de Oliveira Calixto, D. (2020). Communication, education and the social acceleration of time in Brazilian schools. Networking Knowledge: Journal of the MeCCSA Postgraduate Network13(2), 33-48.

Berardi, F., & Silva, R. (2019). Depois do futuro. Ubu Editora LTDA-ME.

Brenner, M. H., & Bhugra, D. (2020). Acceleration of anxiety, depression, and suicide: secondary effects of economic disruption related to COVID-19. Frontiers in psychiatry11, 592467.

Buddeberg, M., & Hornberg, S. (2017). Schooling in times of acceleration. British Journal of Sociology of Education38(1), 49-59.

Friedman, W. J., & Janssen, S. M. (2010). Aging and the speed of time. Acta Psychologica134(2), 130-141.

Ekman, P. (2018). Atlas of Emotion.

Rosa, H. (Ed.). (2010). High-speed society: Social acceleration, power, and modernity. Penn State Press.

Singh, M. K. K., & Samah, N. A. (2018). Impact of smartphone: A review on positive and negative effects on students. Asian Social Science14(11), 83-89.

Skinner, B. F. (1953). Science and human behavior. Free Press.

Sugarman, J., & Thrift, E. (2020). Neoliberalism and the Psychology of Time. Journal of Humanistic Psychology60(6), 807-828.

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