Diferenças entre sociopatia e psicopatia | O que você precisa saber

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Sociopatia é um termo do senso comum que usamos para nos referir aceca do Transtorno de Personalidade Antissocial (TPAS). Psicopatia é, igualmente, um termo do senso comum utilizado sobre um transtorno mental que exibe certos traços de personalidade semelhantes à sociopatia [1]:

  • Falta de empatia;
  • Arrogância;
  • Carisma;
  • Vaidade excessiva;
  • Dificuldade em expressar de culpa;
  • Dificuldade em interpretar as expressões faciais de outras pessoas;
  • Comportamentos orientados para o objetivo imediato;
  • Insensibilidade aos castigos.

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O Transtorno de Personalidade Antissocial é um transtorno mental classificado como de “personalidade”. Alguns pesquisadores acreditam que a psicopatia é uma forma desse transtorno [também chamado sociopatia], enquanto outros dizem que é um transtorno mental diferente.

O diagnóstico do Transtorno de Personalidade Antissocial [sociopatia] leva em conta as seguintes características [2]:

  • Utilizar-se da mentira;
  • Agir impulsivamente;
  • Ser irritável e agressivo;
  • Ser consistentemente irresponsável;
  • Dificuldade em expressar de culpa;
  • Desrespeitar a lei.

Como podemos observar, a psicopatia compartilha traços semelhantes com o Transtorno de Personalidade Antissocial. Podemos considerar que algumas características são até consequências das outras como, por exemplo: a irresponsabilidade e a agressividade podem estar na origem do desrespeito à lei.

Então, a única conclusão segura que podemos tirar é que os critérios diagnósticos ainda precisam melhorar muito e a pesquisa científica deve avançar nessa área.

Nesse contexto, surgem várias opiniões e alguns afirmam que a psicopatia é um “tipo” de TPAS e que ambos podem ocorrer devido tanto a fatores genéticos, quanto ambientais.

Não há uma cura conhecida cura para nenhum deles. No entanto, existem técnicas terapêuticas que visam gerenciar e controlar os sintomas apresentados pela pessoa.

A minha opinião pessoal é que tem muita conversa e poucas definições mais precisas e distinções relevantes. Ao observarmos os critérios diagnósticos, fica fácil verificar uma correlação de causa-efeito entre eles.

Por exemplo: se uma pessoa é extremamente vaidosa ou narcisista, é esperado que quebre as regras quando isso a colocar em primeiro lugar em relação aos outros. É esperado, pois o transtorno altera as emoções e a cognição envolvidas, levando a pessoa a imaginar que “merece” mais que os outros, daí fica mais fácil “achar” que aquela regra não se aplica no seu caso.

Então, se olharmos bem de perto para os critérios, eles se inter-relacionam e podem “provocar” uns aos outros…. Há, portanto, uma inegável relação entre eles.

 

Quando apareceu a palavra psicopatia?

Inicialmente, esse termo foi utilizado, no Sec. XIX, para se referir ao profissional que cuidava da saúde mental de outras pessoas. É como se fosse hoje o que fazemos a nos referirmos a um homeopata, que é alguém que receita homeopatia. Nessa mesma época chegava-se a chamar os hospitais “psiquiátricos” de instituições psicopáticas [3].

Até a década de 1840, o termo psicopatia também era usado de maneira consistente com sua etimologia para se referir a qualquer doença da mente. Encontramos esse termo em várias obras médicas da época.

O uso do termo em um contexto criminológico foi popularizado a partir da ocorrência de um homicídio ocorrido na Rússia, entre 1883 e 1885, relativo ao assassinato de Sarah Becker. Após a condenação de um suposto inocente e a confissão de realizada por uma senhora de sobrenome Semenova, o psiquiatra russo Ivan M. Balinsky, em seu testemunho nesse caso, a descreveu como uma psicopata [4].

O livro “The Mask of Sanity” [5], do psiquiatra americano Hervey Cleckley, publicado pela primeira vez em 1941, é considerado um trabalho de referência que mostrou uma série de estudos de caso sobre indivíduos então descritos como psicopatas. É atribuída a ele a ideia de objetivar os critérios ou “características” da psicopatia. Com esse título intrigante, ele pretendeu sugerir que existe uma “máscara” que encobre o transtorno, a desorganização e amoralidade dessas pessoas.

A partir daí, o termo foi cada vez mais sendo utilizado para significar uma pessoa com as características anteriormente descritas e se popularizou no uso jornalístico e científico [assim como a sociopatia]. Entretanto, é necessário pontuar que nenhuma dessas palavras faz parte do vocabulário empregado no Manual Estatístico de Transtornos Mentais ou da Classificação Internacional de Doenças.

 

Mais confusão a caminho sobre a sociopatia

Há algum tempo inventaram a expressão “Tríade Sombria”. Parece que a psicopatia funcional se desgastou, então a fila tem que andar. O debate intenso sobre a psicopatia vs. sociopatia, na sociedade norte-americana, vem desde a década de 70. Então, “tá meio velhinho” (já tem muito livro)….

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Os próprios termos em si (psicopatia/sociopatia) estão contaminados pelo seu uso anterior no senso comum e, dificilmente, virão a ser termos técnicos. O debate sobre as possíveis e supostas diferenças entre psicopatas e sociopatas não tem fim.

A minha impressão é que mais uma expressão (Tríade Sombria) foi  forjada para a venda de livros, realização de debates e venda de novos testes psicológicos padronizados (essa sim uma verdadeira tríade sombria). Lembrando que nos EUA uma pessoa pode ficar muito rica se alguma dessas  três coisas der certo. Principalmente se um livro sobre a Dark Triad vier a ser um best seller.

O próprio nome do “transtorno” me parece ter sido criado com essa finalidade. Fica bacana qualquer título que tenha “Tríade Sombria” no meio. Parece também que existe um apelo mágico que remete ao número 3, aproveitando, não conscientemente, muitas abordagens religiosas nas quais essa quantidade é sagrada ou reverenciada.

Além disso, me parece um termo nada técnico, apesar de originar-se de acadêmicos e de pesquisas científicas…. Esse também é um aspecto interessante. A psicopatia (ou sociopatia) se caracteriza, entre outras coisas, pelo narcisismo e pelo maquiavelismo (termos também batidos no senso comum). Então, essa associação me parece bastante tautológicaóbvia e difícil para realizar um diagnóstico diferencial.

Mais detalhes sobre essa “síndrome” no artigo: Tríade Sombria (Dark Triad), o que não te contaram;

 

Resumindo psicopatia vs. sociopatia

Existe muita confusão em torno da utilização distinta dos termos psicopatia/sociopatia. Para nós, meros humanos, não vejo que diferença faça usar um ou outro termo, já que estaremos tentando expressar as nossas ideias sobre uma pessoa narcisista, malvada e extremamente manipuladora….. Para nós, então, não faz diferença e muito debate torna-se até bem chato.

Ainda mais se entendermos que há um espectro de diferentes condições que compartilham as mesmas características. Sob essa ótica, na prática das relações humanas no trabalho e na família não há tanto problema em utilizar os termos de forma intercambiável, já que os dois são provenientes do senso comum e não servem para uma definição diagnóstica técnica de um transtorno mental.

Entretanto, temos que admitir que há relevância acadêmica e terapêutica sobre a distinção dos transtornos associados a essas duas palavras.

Artigo do Dr. Ekman sobre o tema

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Referências

[1] 7 Characteristics of the Modern Psychopath. Disponível em: <https://www.psychologytoday.com/us/blog/communication-success/201810/7-characteristics-the-modern-psychopath>

[2] Anderson N. E., Kiehl K. A. (2014a). Psychopathy: developmental perspectives and their implications for treatmentRestorat. Neurol. Neurosci. 32, 103–117.

[3] Toch, H. Chapter 9: Psychopathy or Antisocial Personality in Forensic Settings. In T. Millon & E. Simonsen (Eds.) (2002) Psychopathy: Antisocial, criminal, and violent behavior New York, NY, US: Guildford Press

[4] Murder Most Russian: True Crime and Punishment in Late Imperial Russia Louise McReynolds, Cornell University Press, 18 Dec 2012

[5] The Mask of Sanity – 5th edition, 1988, “scanned facsimile produced for non-profit educational use”

2 comentários em “Diferenças entre sociopatia e psicopatia | O que você precisa saber”

  1. Olá Dr. Senna,

    Eu gostaria de entender melhor as razões pelas quais o Sr. acha que não devemos nos preocupar com a distinção entre psicopatas e sociopatas. Não seria interessante saber a diferença entre eles para agirmos diferente conforme a situação?
    Grato

    Responder
    • Olá Alexandre, muito obrigado pelo seu interesse em nosso tema e pela sua pergunta.

      É claro que eu acho que é importante que um transtorno tão complexo quanto o TPAS tenha seus termos associados bem definidos. Na verdade, uma enorme quantidade dos transtornos mentais são parte de um espectro de transtornos. Então, essa confusão é esperada, pois uma mesma pessoa pode não reunir o mesmo conjunto de características ou, se reunir, as características podem se apresentar em diferentes graus.

      Então, para efeitos acadêmicos e/ou terapêuticos, é muito bom que tenhamos a diferenciação de diferentes problemas. Assim sendo, pode-se desenvolver estratégias terapêuticas mais específicas e também mais eficazes. É assim que eu entendo. Principalmente no caso de transtornos que ainda não têm cura, mas que apenas temos estratégias para lidar com os seus comportamentos indicadores.

      Entretanto, penso que, para efeitos práticos no contexto do cotidiano, não há necessidade da preocupação com essa diferenciação terminológica, já que as características coincidem e não há tanta relevância na consideração dos graus desse transtorno.

      Você deve considerar, por exemplo, que não importa se você chama o chefe que inferniza a sua vida diariamente de psicopata ou sociopata… Na verdade acho até que você deve chamar o distinto de fi$#@o da P&%ta. Não é? O que importa mais nesse contexto, é saber o que você deve fazer e como você vai lidar com isso nas suas tarefas diárias.

      Essa foi a mensagem que eu quis transmitir.

      Muito obrigado e siga acompanhando nossas postagens
      Um abraço

      Sergio Senna

      Responder

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